Voltar
para Menu das Histórias de Corredor |
*Texto
de no máximo 4 mil caracteres [ou duas
(02) páginas]
**máximo cinco (05) Imagens em JPEG - resolução
150 DPIS
OS TEXTOS SERÃO REVISADOS E EDITADOS SEGUNDO
CRITÉRIOS DE REDAÇÃO CORPORE.ORG.BR
Exclusivo para Associados Corpore |
Ana
Claudia Ramalho - corredora associada e médica
endocrinologista em Minha História
Tenho 37 anos, sou médica, endocrinologista,
maratonista e portadora de diabetes tipo 1 há
21 anos. Na época do diagnóstico do diabetes
me preparava para o vestibular de psicologia. Frente
ao novo fato, resolvi persistir na opção
profissional já feita anterior ao diagnóstico;
mas no ano que se seguiu foi aumentando o meu interesse
pelo melhor conhecimento da doença e não
hesitei em prestar um novo vestibular e assumir que
a idéia de estudar e entender melhor o que se
passava comigo poderia ser o grande impulso de minha
opção profissional.
Desde menina, sempre fui estimulada a desenvolver uma
atividade física como parte do quotidiano para
meu desenvolvimento; inicialmente dança, natação,
tênis e posteriormente o ballet clássico
que me envolveu durante 11 anos. Aos 16 anos tive o
diagnóstico de diabetes mellitus e uma insulinização
desordenada me levou a um aumento de peso e ao desinteresse
pelo ballet, pois sentia que no domínio da dança
já não havia mais um espaço para
mim. Completamente desmotivada, passei a apreciar a
corrida que já realizava anteriormente em algumas
oportunidades com meu pai que praticava há vários
anos. Corríamos juntos e pouco a pouco fui redescobrindo
as potencialidades de meu corpo mesmo ressentido por
uma doença crônica; aí veio o prazer
de correr, uma paixão que me equilibra tanto
física quanto moralmente. Correr não exige
muitas coisas: não importa o lugar, não
precisa de uma companhia, não exige trajes sofisticados;
só precisamos sim, de um adequado par de tênis.
É essa simplicidade da corrida que faz com que
ela se torne um vício. Eu tento escolher lugares
com um bom estímulo visual: um parque, um jardim,
à beira mar... este contato com a natureza me
recompensa o esforço físico.
Ao
longo dos anos fiz da corrida meu equilíbrio
psicológico. Comecei a correr as pequenas corridas
de 6, 10, 14 Km. Em São Paulo, participei de
várias corridas da CORPORE. Na academia de ginástica
éramos um grupo de amantes da corrida e nos encontrávamos
para corridas no parque Ibirapuera. Assim, pequenos
estímulos se transformavam para mim em grandes
estímulos de superar a mim mesma. Com a corrida
evito doses altas de insulina e, portanto, evita um
aumento do peso como ocorreu no início da doença
e que me levou à uma perda da minha imagem corporal.
Em 1997, morei em Paris para realização
do meu doutorado. Nesta oportunidade comecei a correr
todos os dias e não importava a estação
do ano; corria no parque Montsouri com os lagos congelados;
era maravilhoso! Procurava trabalhar melhor minha resistência
em terrenos acidentados com grandes ladeiras. Final
de semana procurava fazer um pouco de turismo por parques
que desejava conhecer, sempre correndo e assim fazia
percursos mais prolongados; senti que minha resistência
melhorava e resolvi me inscrever na maratona de Paris
para correr apenas a metade ou seja 21 Km. Me preparava
diariamente correndo.
Com a rotina das corridas as hipoglicemias se tornaram
frequentes e tive que mudar meu esquema de insulina.
Cada indivíduo com diabetes deve fazer uma adaptação
do seu tratamento após o início da atividade
física, principalmente naqueles que usam insulina.
Este reajuste depende de algumas particularidades: horário,
intensidade e frequência da atividade física,
ingestão de carboidratos, etc.
Na
França existem associações de esporte
e diabetes que estão constantemente desenvolvendo
eventos esportivos para estimular os diabéticos.
Eu era associada à Associação Francesa
de Diabéticos (AFD) e a Associação
de Sport e Diabetes (ASD). Resolvi então, entrar
no grupo de diabéticos da AFD para correr a maratona
de Paris em 1998. Éramos 12 diabéticos.
Nos reunimos anteriormente para sermos orientados sobre
o esquema de controle. A cada 5 Km após o Km
10 havia um posto de controle da AFD com médico,
enfermeira e todo material para controle da glicemia,
reposição hídrica e de carboidrato;
essa estrutura nos dava uma segurança e podíamos
compartilhar e entender melhor o comportamento da nossa
doença frente a uma atividade física extenuante.
Cheguei ao Km 20 onde havia me proposto parar, mas eu
me sentia em plena forma, cheia de energia e segura
com toda aquela estrutura para diabétcos.
Durante o percursso minha glicemia foi baixando mesmo
com a ingesta de 15-20g de carboidrato a cada 5 Km.
No Km 40 tinha hipoglicemia, mas não sentia,
pois o exercício físico pode embotar a
percepção de uma hipoglicemia. Neste ponto
percebi a diferença de ter uma doença
crônica em um país que tem uma consciência
social e procura integrar todos os cidadãos em
suas atividades! À partir deste ponto até
a chegada fui acompanhada por um enfermeiro que me seguia
numa bicicleta com a reposição de carboidrato
necessária e sempre me estimulando. E enfim,
lá estava eu, chegando, a única mulher
diabética correndo pela AFD após 5 horas
de corrida. Era a maior vitória de superação
de meus limites. Não era simplesmente completar
uma maratona, era perceber-me com um potencial de superar
os limites da própria doença.
Percebi claramente que o trabalho de apoio da AFD e
a estrutura montada foram decisivos. Percebi como é
importante para o diabético programas de incentivo
e apoio ao desenvolvimento de atividade física
e voltei com esta idéia em minha cabeça:
criar uma associação de incentivo ao exercício
físico e diabetes, não apenas em teoria,
mas sim com a prática como vivenciei. Depois
da maratona ainda fiz outras corridas menores em Paris;
minha vontade era de não parar mais.
De
volta ao Brasil, entrei num grupo de corredores em Salvador
e participei de várias corridas de rua aqui e
em outros estados. Nessas corridas tive a decepção
de perceber que não existe uma mínima
estrutura para os diabéticos, nem glicosímetro
nos postos médicos !!! Ou seja se um diabético
estiver correndo e precisar de uma glicemia capilar
não pode realizar, a não ser que faça
como eu, ou seja, leve consigo seu glicosímetro
e realize por si mesmo durante a corrida. E é
isso que tenho feito nas provas de rua no Brasi.
A
monitorização da glicemia capilar durante
a atividade física é de fundamental importância
para que possamos verificar as diferentes variações
glicêmicas ligadas aos diferentes exercícios.
Assim, já observei que uma corrida longa num
ritmo mais lento tende a reduzir os níveis glicêmicos
já durante o percurso, porém corridas
de distâncias mais curtas (< 10 Km) em velocidade
mais elevada, elevam a glicemia de forma imediata, pois
estão ligadas à liberação
de adrenalina; nestes casos a queda dos níveis
glicêmicos ocorrerá na noite do dia da
corrida. Essas observações só são
possiveis com a auto-monitorização.
A
experiência vivida que me possibiltou um auto-conhecimento
da minha resposta glicêmica tornando possível
continuar correndo maratonas no Brasil, como a de Porto
Alegre e Curitiba.
Frente a esta experiência tão positiva,
comecei a trilhar caminhos para colocar este tipo de
apoio em corridas de rua no Brasil. Em 2003, criei o
departamento de exercício da Sociedade Brasileira
de Diabetes para podermos apoiar exercício e
diabetes no Brasil para os indivíduos com diabetes.
Colocamos pela 1ª vez no Brasil este suporte em
uma corrida de rua no Brasil, na maratona de revezamento
pão de Açúcar e isso foi divulgado
conforme foto do jornal ao lado. É fundamental
que o atleta com diabetes conheça sua resposta
glicêmica ao esforço e quais as adaptações
necessárias ao tratamento antes, durante e depois
da corrida. Com este tipo de apoio fica bem mais fácil,
pois além do glicosímetro, a presença
de endocrinologistas que auxiliarão nas adaptações
necessárias.
Além
do departamento de exercício da SBD (Sociedade
Brasileira de Diabetes), criei em 2003 a DESA-Brasil
(Diabetes Exercise and Sport Association). A DESA tem
como objetivo: melhorar a qualidade de vida de pessoas
com Diabetes através da atividade física.
A DESA fornece: conferencias, jornais, website, apoia
eventos esportivos, coloca em contato pessoas com diabetes
e praticantes de exercício.
A DESA foi fundada em 1986 por Paula Harper como IDAA
(International Diabetes Athletic Association) e em 2000
passou a ser DESA (Diabetes Exercise and Sport Association)
com objetivo de abraçar não só
atletas, mas também as pessoas que fazem exercício.
Paula Haper (foto ao lado) é americana tem mais
de 60 anos, é maratonista (Já correu mais
de 30 maratonas!), enfermeira e portadora de Diabetes
tipo 1 e me incentivou bastante a criação
desta associação aqui no Brasil.
Enfim, no momento contamos com a DESA e o departamento
de exercício da SBD para darmos suporte aos atletas
com diabetes, além de oferecer cursos para os
profissionais de educação física
sobre exercício e diabetes, visando preparar
melhor este profissional a trabalhar com o atleta com
diabetes na corrida e em outras modalidades esportivas.
Você
que tem diabetes, comece pouco a pouco uma atividade
física, não importa qual, mas que te dê
mais prazer; use e abuse dela, criando metas, se impondo
pequenos desafios e assim descobrindo as potancialidades
do seu corpo que te reequilibrarão metabólica
e psicologicamente.
Atletas com Diabetes vamos
participar das corridas, pois as corridas da CORPORE
agora terão apoio para os atletas com Diabetes
!
Ana
Claudia Ramalho
Endocrinologista, Corredora e Diabética tipo1
Coordenadora do departamento de exercício da
SBD - Sociedade Brasileira de Diabetes
Fundadora e Presidente da DESA-Brasil
Associação de Exercício Esporte
e Diabetes
Saiba
mais sobre o trabalho da Corpore junto aos diabeticos
e confira a evolução no atendimento médico
Corpore. Clique aqui.
Associado
Corpore: Gostou da história que acabou de ler?
Pois então colabore com esta coluna. Divida suas
histórias com outros corredores. Para isso, nos
envie seu texto* e imagens** para [email protected]
e aguarde a publicação aqui no site! Participe
|