Treinador
de atletismo desde 1980, Ricardo D’Angelo é
um dos mais conhecidos e respeitados treinadores do
Brasil. Um dos seus atletas de maior destaque é
Vanderlei Cordeiro de Lima, o qual ele acompanhará
em Atenas.
Leia
abaixo entrevista com Ricardo e saiba mais sobre seu
trabalho, suas expectativas e suas opiniões.
Como
se iniciou no esporte?
Tomei contato com o atletismo nas aulas de educação
física, com 13 anos de idade. Tinha um professor
muito bom, seu nome é Sebastião Correia
e ele era da Polícia Militar. Entre suas boas
aulas, ele convidava os alunos que se destacavam para
treinos de atletismo na ADPM, clube da Polícia
Militar. Ele foi treinador do primeiro fundista brasileiro
a se destacar no Brasil e internacionalmente, o José
Romão de Andrade e Silva, e também presidente
da Federação Paulista de Atletismo nos
anos 80. Após curto período na ADPM, fui
treinar no Constâncio Vaz Guimarães, Ibirapuera,
com o Prof. José Antonio Rabaça, que no
futuro me levou para o Clube Pinheiros. Com o Prof.
Rabaça, me desenvolvi como atleta, conquistei
resultados em nível nacional e aprendi a amar
o atletismo, sentimento que trago forte dentro de mim
até hoje.
Como foi seu início como treinador de
corridas?
Mesmo
antes de me formar em Educação Física,
já iniciava minha carreira de treinador de atletismo
estagiando no Centro Esportivo da Lapa, o “Pelezão”.
Desde1980, ano em que comecei a atuar como professor
e treinador nesse local, até os dias de hoje,
sempre estive ligado ao atletismo, porém, trabalhei
simultaneamente com outros 2 esportes, como preparador
físico: em 1988, no time de Futsal da Hebraica
e de 1990 a 1995, com basquetebol masculino na Pirelli,
Sírio e Telesp. Trabalhei também como
professor de educação física em
uma escola particular por 4 anos, de 1982 a 1985.
O
que o estimulou a entrar nesse ramo?
Meus
principais estímulos foram meu treinador, o Rabaça,
e a paixão pelo esporte e seu meio. O convívio
com meus amigos do atletismo foi tão intenso
que essas relações duram até hoje.
Trabalhar com a competição foi outra motivação
para encarar a carreira de treinador.
Ao
longo desses 24 anos treinando, como você desenvolve
seus treinos atualmente?
Minhas
programações são produto de princípios
científicos do treinamento desportivo. Após
passar pela fase de atleta, estudante de educação
física e treinador iniciante, você acaba
desenvolvendo um estilo próprio de trabalho,
porém sempre baseado nos princípios do
treinamento. Esses princípios são: individualidade
biológica, sobrecarga, especificidade e reversibilidade.
Qual
seu público alvo? Quem você treina?
Hoje
trabalho com atletas de elite na equipe do Pão
de Açúcar/BM&F, com atletas iniciantes
na equipe Orcampi/Unimed de Campinas e presto consultorias
na área de corridas.
Quais
seus alunos de maior destaque?
Entre
os atletas de elite, tenho o Vanderlei Lima, Elias Bastos,
Eduardo Nascimento, Adriano Bastos, Celso Ficagna, Vinícius
Lopes, Gilson Vieira e o João Stingelin, melhor
fundista juvenil de 2004. Entre aqueles que oriento
via consultoria, destaco o Arilton Malagrino (60 anos)
que em menos de 1 ano de treinamento sistemático
correu 1h30min50seg para a meia maratona.
Já
estamos vivendo as Olimpíadas de Atenas e nos
próximos dias teremos as competições
de atletismo. Quais suas expectativas?
Acredito
que o Brasil está com uma excelente equipe em
Atenas. Temos atletas experientes, que já participaram
de outras edições dos Jogos e outros,
em desenvolvimento, tentando bons resultados. Entre
as expectativas de medalha, vejo as mais claras com
o Jadel no salto triplo e o revezamento 4x100 masculino.
Outros atletas podem ser finalistas e entrar entre os
8 melhores como Osmar Santos e Luciana Mendes nos 800m,
Vanderlei Lima na maratona, revezamento 4x400 feminino
e Elisangela Adriano no peso.
Como
você já informou, Vanderlei Lima é
treinado por você e um dos mais consistentes maratonistas
brasileiros. Há quanto tempo ele treina com você
e como é o treinamento dele?
Treino
o Vanderlei há exatos 12 anos e meio. Seu treinamento
é individualizado e complexo, respeitando aqueles
princípios já citados. Inclui 11 a 12
sessões de treinos por semana, musculação,
técnicas de corrida, com predominância
de trabalhos de capacidade aeróbia.
Muitos
atletas que correm atualmente sonham em participar de
uma maratona. Depois de quanto tempo de treinamento
você acredita que uma pessoa está preparada
para encarar uma maratona?
É
preciso o atleta ter um histórico esportivo antes
de iniciar em maratona. Estudos mostram que os atletas
devem estar completamente desenvolvidos e com uma condição
fisiológica consolidada para receber a carga
de uma maratona. Este tempo pode variar de atleta para
atleta, por exemplo: no caso de um atleta ter iniciado
sua carreira com 17 anos, ele deverá primeiro
se formar, amadurecer fisicamente e assim, com 25 ou
26 anos ele poderá correr os 42km; já
para outro atleta que inicia no esporte mais tarde,
na fase adulta, embora já tenha passado pelas
fases de crescimento e desenvolvimento maturacional,
é preciso que ele esteja totalmente adaptado
a sistemática do treinamento, respondendo adequadamente
as cargas de trabalho no treino e na competição,
e isto pode levar entre 4 a 6 anos.
Como
você vê o crescimento das corridas de rua
no Brasil?
Bem,
este é um capítulo bem interessante. Não
tenho nada contra as corridas de rua, embora entenda
que seu crescimento desordenado, prejudica demais a
evolução do atletismo de fundo do Brasil.
Por um lado, temos um grande número de eventos,
com boas premiações, recordes em número
de participantes, divulgação na mídia,
entre outros aspectos que posso considerar positivos.
Porém, estamos em falta com a renovação
de atletas e além disso, o que entendo ser ainda
pior é que fazemos um julgamento errado do caminho
que os bons fundistas de hoje seguiram no passado. A
maioria dos treinadores de hoje encaminham, assim que
seus jovens atletas demonstram potencial, diretamente
para as corridas de rua, desconsiderando a principal
etapa na formação do fundista: a participação
na pista e no cross-country. Isto nos leva a perceber
que temos pseudotalentos correndo distâncias muito
maiores daquelas indicadas para sua idade, na rua, e
com carreira de curto prazo, sem nunca ter participado
de uma úmica competição em pista.
Qual a justificativa deste comportamento? Sempre caímos
na falta de apoio e que o garoto precisa ganhar dinheiro
para poder continuar a treinar. Quando nos dermos conta
de que precisamos renovar, espero que não seja
tarde demais.
Você
acredita que estamos em uma crescente nas corridas de
rua e muitas pessoas ainda vão aderir ao esporte?
Acho
que entre os chamados amadores o mercado ainda irá
crescer muito, justamente porque para este segmento
está bem organizado.
Quais
os cuidados necessários para quem está
iniciando no esporte?
Bem,
em primeiro lugar procurar um profissional da área
habilitado e capacitado com quem se orientar. Estabelecer
objetivos concretos, ter muita determinação
e respeitar seu corpo.
Como
você vê o trabalho da Corpore junto aos
treinadores e corredores?
Entendo
que o trabalho da Corpore foi e é essencial para
a evolução das corridas de rua no Brasil.
Todos aqueles que “acham” que sabem organizar
uma corrida de rua deveriam se dignar a passar por alguns
eventos pelos bastidores da Corpore. Certamente, aprenderiam
muito e passariam a respeitar de fato os atletas em
seus respectivos eventos.
Clubes
como a Corpore em SP e outros espalhados pelo Brasil
ajudam nesse crescimento da corrida de rua?
Não
existem no Brasil clubes como a Corpore. Se existissem,
as corridas de rua estariam em primeiro nível
mundial sob o aspecto organizacional e logístico.
Você
também tem uma experiência na imprensa,
escrevendo em revistas e comentando a São Silvestre.
Como você encara esse trabalho?
Comentar
a São Silvestre na TV foi legal, especialmente
quando fiz a de 1997 quando meu atleta na época,
Emerson Iser Bem, venceu. Atualmente, a convite de meu
amigo e amante das corridas Alfredo Donadio, tenho participado
da transmissão pelo rádio, que também
é muito legal e você tem muito mais tempo
e liberdade para falar. Quanto aos artigos que escrevo
para a revista SuperAção, tenho tentado
passar um pouco de minha experiência como treinador
e atingir o leitor com isso. Confesso que no começo
foi um pouco difícil, mas depois de algum tempo,
descobri a magia de escrever e hoje gosto muito da oportunidade
de escrever o que desejo em um espaço como o
que tenho na revista.
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